Reclame Aqui

Conversa de elevador. Era assim que se costumava chamar aquele papo furado que a gente puxa com desconhecidos. “Será que vai chover” e outras especulações sobre o tempo foram clássicos do gênero.

Na última década a conversa de elevador ganhou outros tons. O “tá frio hoje, né?” deu lugar ao “mas e o Lula, hein?”. Nos mais elevados ascensores, aquela xingadinha no PT ou uma piadinha sobre a Dilma era tiro certeiro para conseguir a aprovação do passageiro ao lado.

Não dá para dizer que não houvesse motivo. Para ficar em um só, as cifras que brotaram da Operação Lava-Jato falam por si.

Em tempos mais recentes, novos vilões passaram a dividir espaço com os políticos no sobe-e-desce dos indignados. Os ministros do STF.

A imensa capacidade dos políticos brasileiros de se enrolar em tramas criminosas, aliada à sua incapacidade de se resolver de forma decente na arena política, levaram o Judiciário e, principalmente, o Supremo Tribunal Federal, a um protagonismo exagerado e indesejável num país já repleto de conflitos.

Em concerto com o movimento de negação da política, parte da sociedade resolveu ignorar as instâncias representativas (o Congresso em especial) e, numa espécie de ligação direta, passou a exigir do Supremo um tipo de Justiça que, sabemos pelo exemplo histórico, não funciona.

Não se trata de dizer que o Supremo esteja isento de críticas, muito pelo contrário. Para ficar na grande mídia, vide, por tantos, as colunas de Conrado Hübner Mendes na Folha de S. Paulo.

Mas não se pode exigir do Supremo algo que foge da sua missão institucional, nem que o Judiciário assuma tarefas próprias dos outros poderes. Aliás, uma das muitas objeções que se faz ao Supremo é justamente a de ter uma atuação excessivamente política, ao mesmo tempo em que muitos cobram julgamentos mais alinhados à vontade do povo. Ora, o que pode ser mais “excessivamente político” do que julgar baseando-se mais naquela que se acredita ser a vontade momentânea do povo, e menos naquela que se presume a vontade geral, expressa na Lei, para não falar na vontade fundante expressa na Constituição.

Exemplo evidente do acima exposto se deu no julgamento das Ações Diretas de Constitucionalidade do art. 283 do Código de Processo Penal (prisão em segunda instância).

Ao invés de cobrar os parlamentares, que tiveram na “Emenda Peluso” e no “Pacote Moro” duas oportunidades de mudar as normas existentes e não o fizeram, setores significativos da imprensa e da sociedade em geral resolveram que era dever do Supremo assumir o papel que o Legislativo rejeitou, partindo para um verdadeiro linchamento moral dos que julgaram contra os seus anseios.

É bem verdade que o grau de tensão atingido nesse julgamento também se deveu a atitudes pretéritas da própria Corte, e como já dito, há críticas importantes ao trabalho do Supremo e seus ministros. A questão é entender o que se deve cobrar do Judiciário e o que se deve cobrar dos outros poderes.

Em apertadíssima síntese, na mais alta hierarquia do nosso Estado Democrático de Direito, o Presidente da República é o representante do Estado, o STF representa o Direito (o império da Lei, a Constituição) e o representante do povo (demos), que age em seu nome, é o Parlamento (em especial a Câmara dos Deputados).

A monumental arquitetura da Praça dos Três Poderes não merece, mas talvez o Congresso devesse construir um posto avançado, bem ao lado do prédio do Supremo. Na recepção, um espelho, e na fachada, uma placa: RECLAME AQUI. 

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