A história do Pato Amarelo
Ele surgiu em 2015 e incorporou-se, no ano seguinte, aos protestos que pediam o impeachment de Dilma Rousseff. “Não vou pagar o pato” era o seu mote.
Se os seus genitores, que o
olhavam de cima do prédio da FIESP, na Avenida Paulista, provavelmente não
pagaram o pato, o mesmo não se pode dizer de muitos que o rodeavam lá embaixo,
no asfalto.
A reforma da previdência, o
teto de gastos e inúmeros cortes orçamentários não impediram que o Brasil
apresentasse, a partir do ano em que o pato nasceu, e em todos os demais até
aqui, seguidos déficits fiscais, e a conta que já estava salgada mais que
duplicou no ano de 2020 (em razão da pandemia de Covid-19) gerando um saldo
negativo acumulado de mais de R$ 1,3 trilhão.
Mas, voltando à sua gênese, a bronca
da ave não era, no particular, com a presidenta. O pato foi o símbolo de uma
campanha contra o aumento de impostos, em especial contra a volta da CPMF. No
que, aliás, foi bem-sucedido.
Já naquele ano se antevia um
rombo nas contas públicas, mas a turma do pato achava que não era com ela.
Muitos denunciaram a hipocrisia da campanha, afinal, por mais que um ajuste nas
contas da Previdência e maior eficiência na gestão da coisa pública fossem necessários,
não se dá um cavalo de pau num transatlântico sem jogar muitos homens ao mar;
no caso, os mais pobres e dependentes da atuação do Estado.
Os anos anteriores, inclusive para
os adoradores do pato, haviam sido de bonança, mesmo após o forte impacto da
crise global de 2008.
Em 31 de dezembro de 2007,
último dia de vigência da CPMF, os declarantes de imposto de renda, que naquele
ano-calendário representaram cerca de 13,27% da população, ostentavam, conforme
o consignado em suas declarações, um patrimônio médio de R$ 98.041,43 (total de
bens e direitos declarados, descontadas as dívidas, dividido pelo número de
declarantes). Para o ano-calendário de 2015, aproximadamente 13,46% dos
brasileiros declararam imposto de renda, e apresentaram um patrimônio médio de R$
237.410,18.
Ressalva: os bens e direitos
são lançados nas declarações pelo seu custo de aquisição, ou seja, não é
possível abater a desvalorização de bens sujeitos a depreciação, nem acrescentar
a variação positiva decorrente da valorização de imóveis, joias e obras de
arte, por exemplo.
Mas o fato é que, por esse
parâmetro, os brasileiros de maior renda e patrimônio (ou seja, os que declaram
imposto de renda) terminaram o ano em que o Pato Amarelo veio ao mundo 142,15%
mais ricos do que no fim do ano em que a CPMF, a inimiga nº 1 do pato, nos
deixou. Esse acréscimo foi mais expressivo dentre os declarantes do regime
simplificado (166,70%) e ficou acima da média entre os declarantes com renda mensal
acima de 160 salários mínimos (144,56%).
O incremento patrimonial desse
conjunto de pessoas foi superior à variação da inflação (64,49% pelo IPCA), do
Ibovespa (-30,99%), do CDI (122,28%) e do Dólar (120,40%). Ao mesmo tempo, o
PIB per capita brasileiro cresceu
104,77% e o salário mínimo 107,37%.
O pato ouriçou as penas para
lembrar que a despesa do Governo Federal em 2015 foi 158,13% maior do que a de
2007, em valores correntes, mas fechou o bico sobre o fato de que a carga
tributária recuara em cerca de 2,5% do PIB nesse período, encerrando 2015, de
acordo com a Receita Federal, no patamar de 32,02%, um pouco acima (0,23%) do
ano anterior e 1,68% abaixo da média dos países da OCDE.
Esse aumento de despesas não
se deu por igual entre as várias rubricas. Maiores gastos da União, a despesa
com pessoal e encargos sociais aumentou 97,84% no período, e a previdenciária,
139,24%, sempre em valores correntes. Ambas acima da inflação, mas abaixo do enriquecimento,
por assim dizer, dos contribuintes do imposto de renda pessoa física.
Apesar disso, o movimento do
Pato Amarelo encontrou apoio e foi abraçado justamente pelo grupo que tinha
melhores condições e maiores razões para pagar o pato, pois amplamente
beneficiado pelo estado de coisas que antecedeu a crise doméstica de 2015/2016.
Quando lembro que de lá para
cá o déficit permaneceu e a carga tributária subiu ininterruptamente até 2019
(inclusive) chego a pensar que o enorme objeto inflável entrou de gaiato
naquelas manifestações; caiu como um patinho. Mas acabo concluindo que os
pato-amarelistas não estão assim tão preocupados com essas coisas. Eles só não
querem pagar o pato.
Fontes:
Receita Federal - Grandes Números DIRPF
Comentários
Postar um comentário