Frases de Rui (12): entre o tudo e o nada

O que caracteriza a tirania é a negação do direito, como direito, na sua legalidade.

 

Promulgada a Lei Áurea, o movimento abolicionista se viu dividido entre a república e a monarquia.

Por mais que se levantassem argumentos de Ciência Política, não era uma discussão verdadeiramente teórica, pois aos democratas era sabido que uma monarquia constitucional poderia levar ao mesmo objetivo almejado pela fórmula republicana.

No fundo, tratava-se de confiar ou não que a princesa regente, Isabel, pudesse ser a futura rainha de uma monarquia constitucional, federativa e de inspiração liberal.

Alguns, como Joaquim Nabuco, viram na abolição uma promessa de mudança de rumo, para uma monarquia democrática, e acreditavam que a mudança de posição dos antigos defensores da escravidão - que foram engrossar as fileiras republicanas -  demonstrasse isso.

Por outro lado, Ruy Barbosa apontava que o Império, inclusive em períodos de regência isabelina, resistiu o quanto pôde à abolição, que teria ocorrido apesar da vontade de Isabel, e não por causa dela, e agora usava a força contra as assembleias republicanas.

Em artigo no Diário de Notícias, aos 02 de abril de 1889, lembrou, entre outras coisas, que os “meetings” abolicionistas ocorriam em edifícios particulares pois o direito de reunião estava abolido das ruas sob as ordens do Barão de Cotegipe, outrora presidente do Conselho de Ministros.    

Replicando-lhe, o jornalista Ferreira de Araújo, da “Gazeta de Notícias”, relembrou outro episódio, envolvendo um “meeting” pelas eleições diretas, em 1881, convocado pelo deputado Lopes Trovão e dispersado pela polícia, numa época em que Barbosa era simpático ao gabinete de turno.

Em resposta à provocação, além de pontuar outros detalhes daquele episódio e assumir o erro, Barbosa fez uma afirmação fundamental:

“O que caracteriza a tirania, é a negação do direito, como direito, na sua legalidade”.

Comparou então, a atitude de um governo que exerce a polícia sobre as reuniões para que não se tornem desordeiras - e pode nesse mister cometer excessos – com outro que simplesmente suprime o direito de reunião – e é essa sua alegação sobre o Império brasileiro naquele momento:

 


Essa distinção deve ser repetida à exaustão nestes tempos de extremismos e pensamento binário.

Uma coisa é limitar um direito. Outra, bem diferente, é riscar esse direito da ordem jurídica. Como disse Rui Barbosa:

“Entre uma e outra coisa vai o infinito, que medeia entre o sim e o não”.

Tratar essas situações como se fossem iguais, além de tremenda desonestidade intelectual, põe a perder décadas de evolução do Direito Constitucional e das técnicas de compatibilização e otimização dos direitos, que nos permitem lidar com as nuances de um mundo em veloz transformação.  

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